Gratidäo

di Antonio de Curtis

Esta noite, na cama, com um grito,
Virei a casa toda do avesso.
Pulos e saltos dei como um cabrito
E quando penso nisso ainda estremeço.

Mas como posso eu, com tantos sonhos,
Sonhar logo de todos o pior?
Este sonho meu, que é o mais bisonho,
Que pode ter um pobre sonhador.

Estava no cimo de alta montanha
E de repente oiço um grande lamento
Em sítio que näo tinha nem vivalma
E disse para comigo: Isto é o vento!

E pondo-me a correr encosta abaixo
eis que descubro a meio da vertente
um pedregulho no meio de um buraco
E debaixo de tudo uma serpente.

- Quem me acode? Socorro! - O pobre animal
berrava e só se ouvia este seu brado.
E assim que me sentiu: - Ai! estou täo mal!
Salve-me antes que eu morra sufocado!

- Quem é que te deixou desta maneira? -
Perguntei-lhe eu, enquanto o libertava.
- Maldito quem me fez tal brincadeira! -
Respondeu-me ela, e já recuperava.

- Se näo fosse você eu morreria
Ai, meu salvador, deixe-me abraçá-lo! -
E toda em torno a mim me envolvia
Que por pouco näo me tirava o ar.

- Deixa-me! - disse-lhe eu. - Queres que morra?
- E pouco a pouco as forças me faltavam,
E o alento sentia ir-se-me embora...
E ela cada vez mais me ia apertando!

- Bom agradecimento que me dás!...
A quem te dá de comer mordes a mäo?
Assim pagas a quem o bem te faz...
É a isto que tu chamas gratidäo?

- Meu caro amigo, eu cá nasci serpente.
Quem serpente nasce há-de ser traidor.
Por isso te como! Mas já te esqueceste
Que o homem costuma ser bem pior?

traduzione di
José Calaço Barreiros